Há poemas que retratam e também fazem a alma de um povo. Um dos meus favoritos de Ovídio Martins, poeta cabo-verdiano.
FLAGELADOS DO VENTO LESTE
Nós somos os flagelados do Vento-Leste!
A nosso favor
não houve campanhas de solidariedade
não se abriram os lares para nos abrigar
e não houve braços estendidos fraternamente para nós
Somos os flagelados do Vento-Leste!
O mar transmitiu-nos a sua perseverança
Aprendemos com o vento o bailar na desgraça
As cabras ensinaram-nos a comer pedras para não perecermos
Somos os flagelados do Vento-Leste!
Morremos e ressuscitamos todos os anos
para desespero dos que nos impedem a caminhada
Teimosamente continuamos de pé
num desafio aos deuses e aos homens
E as estiagens já não nos metem medo
porque descobrimos a origem das coisas
(quando pudermos!...)
Somos os flagelados do Vento-Leste!
Os homens esqueceram-se de nos chamar irmãos
E as vozes solidárias que temos sempre escutado
São apenas
as vozes do mar
que nos salgou o sangue
as vozes do vento
que nos entranhou o ritmo do equilíbrio
e as vozes das nossas montanhas
estranha e silenciosamente musicais
Nós somos os flagelados do Vento-Leste!
3 comentários:
(sem palavras... fiquei assim)
beijo de ca'
Pois olha... conheço muito bem, mas porque nunca me dei ao trabalho de olhar para a ficha técnica, para mim era um poema do fausto. Do album "a preto e branco"
Beijos de lá !!! :-)
Sim, julgo que é esse o álbum do Fausto; o poema é do Ovídio, escritor e jornalista (1928-1999)e descobri-o há muitos anos numa antologia poética que me desapareceu lá de casa (a da mãe), não sei levado por quem.
Beijos de acoli :)
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